HISTÓRIA DA MEDICINA | artigo 19 |
MEDICINA LEGAL – BREVES NOTÍCIAS DE ALGUNS SUCESSOS INÉDITOS E INTERESSANTES DA CIÊNCIA DE ZACCHIAS NA BAHIA, DESDE 1806 - PARTE I | |
Antonio Carlos Nogueira Britto Vice-presidente do Instituto Bahiano de História da Medicina e Ciências Afins, fundado em 29 de novembro de 1946 |
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Conferência recitada em sessão ordinária do Instituto Bahiano de História da Medicina e Ciências Afins, em sala do egrégio Instituto Geográfico e Histórico da Bahia, em 14 de agosto de 2003. | |
Breves notícias pesquisadas em fontes primárias - manuscritos originais e inéditos - e em fontes secundárias, impressas, em derredor de alguns aspectos da Medicina Legal na província da Bahia. | |
Ilustres e ilustrados confreiras e confrades, Antes de apresentar algumas notas inéditas respeitantes a sucessos ligados à ciência de Zacchias, desde o ano de 1806, na Bahia, permitam-me tornar mais ameno o início desta modesta preleção relatando fato assaz hilariante. Nas minhas “costumeiras jornadas ao século XIX”, quase no ocaso de canicular véspero de uma segunda-feira, no dia 6 de fevereiro de 1860, após saborear opípara iguaria de “feijão come-calado”, regado a cerveja Triângulo de Bass, precatava-me do inclemente estio por meio de rico chapéu de sol de seda guarnecido com elegante cabo, de patente Parragon, alem de usar chapéu de “Chili” finíssimo, abas largas, copa alta, transado fino, trajando-me com “palitot” de esguião de linho branco e coletes, gravatas de seda, comprados à “Nouvautés de Paris”, na rua dos Droguistas, na cidade da Bahia. Acompanhado dos inseparáveis amigos Fernando de Souza Pedroza, Lamartine de Andrade Lima, José dos Santos Pereira Filho e Alcilídio Barreto de Carvalho, celebrado e querido “lente jubilado” do “Collegio Médico-Cirúrgico da Bahia”, da mesma forma donairosamente trajados, sentei-me no aprazível “Café Restaurant” do Largo do Theatro, por cima da cocheira de carros, para saborear sorvete em sala para família, com entrada particular. Comprei a gazeta “Diário da Bahia” daquele dia,” e perlustrei a interessante e singular coluna “Publicações a Pedido”, com o título “Roubo e Envenenamento”. Transcrevo, na íntegra, o assunto registado: “O abaixo assignado faz publico que achando-se bastante grave de sua saude, tanto que fazem hoje 12 noites que grita desesperadamente com dores atrozes como é sabido em suas correspondencias, previne aos Srs. Drs. da faculdade de medicina que no caso de morrer podem abrir seu corpo, e então ficarão todos conhecendo a sua verdade na imputação que faz ao sr. Sebastião Pinheiro da Silva Barbosa, lapidário, que envenenou-o para roubar a ridicula quantia de 3.000$000, suppondo que elle talvez tivesse um thesouro de Rotischild; mas enganou-se, só achou o que sempre se dizia a elle. Esta será a ultima correspondencia que escreve o abaixo assignado contra este monstro, porquanto o publico já está sciente quem seja o sr. Barbosa. Bahia 3 de Fevereiro de 1860 – José Felix de Mattos (Ao Diário da Bahia).” Na manhã de sexta-feira, 10 de fevereiro de 1860, em companhia
do meu bom Lamartine, que ansiava oferecer rico mimo a uma formosa rapariga,
fomos ao salão de costuras de Madame Jaccard, costureira modista,
que havia se mudado da rua Direita do Palácio para a rua do Pão-de-Ló,
n.º 15 , 1º andar. Em lá chegando, Lamartine manuseou
o “Diário da Bahia” do dia anterior e mostrou-me a
resposta, anônima, à nota do sr. José Felix de Mattos:
“A esterco-nina (stryquinina) – Roga-se ao maluco envenenado
que offereceo o corpo á faculdade de medicina que offereça
antes a alma ao diabo e deixe o corpo para mim para estercar o capim,
visto não me ter pago ainda os 80$000 que tomou sobre o relogio,
que não vale 40$000 e sem juro. - Diário da Bahia, 6 de
Fevereiro de 1860.” Caríssimos confreiras e confrades. Em traços largos, esforçar-me-ei para apresentar alguns sucessos em torno da Medicina Forense anciana, desde 1806. Devo manifestar no azo que se me apresenta, meus preitos aos precursores e egrégios lentes da ciência de Zacchias na Bahia. Com emoção própria de humílimo e insignificante pesquisador, nomeio os Doutores João Francisco de Almeida, Malaquias Álvares dos Santos, Salustiano Ferreira Souto, Francisco Rodrigues da Silva, Virgilio Climaco Damazio, Raymundo Nina Rodrigues, Josino Cotias, Oscar Freire, Álvaro Dória, Artur Ramos e Estácio de Lima. Hoje, convivendo com seus amigos, colegas e confrades e a todos ilustrando e animando, os celebrados mestres Maria Theresa de Medeiros Pacheco e Lamartine de Andrade Lima, os quais, honrando-me sobremaneira, estão presentes a esta tertúlia do colendo Instituto Bahiano de História da Medicina e Ciências Afins, anciano sodalício que é notável, desde 1946, em solenizar a epopéia dos sucessos e dos insignes vultos da história da Medicina da Bahia. Nos séculos XVIII e XIX, os físicos e cirurgiões, convocados pela justiça ou pelo capitão-general das capitanias ou pelo presidente da província, realizavam perícias médico-legais, corpo de delitos, redigiam laudos e acompanhavam os castigos de açoites para verificar se o estado do condenado permitia continuar ou interromper a vergastada. O cirurgião-de-Partido era estipendiado pelas Câmaras das cidades e vilas para exercer suas atividades médicas rotineiras, além de exames de “corpo de delicto” e perícias médico-legais. O físico Willem Piso, no século XVII, da administração
de Nassau, efetuou as primeiras necropsias no Brasil. No século XIX, poucas teses de doutoramento e monografias relativas
a temas de Medicina Legal foram defendidas e escritas na Bahia: Seguiremos apresentando tópicos sinópticos, assemelhados à cronologia dos casos em derredor do tema abordado. |
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1806 – Quinta feira, 20 de fevereiro,
10 horas da noite. Recolhia-se ao Hospital Real Militar da Bahia, o soldado
Luis Manoel, da 7ª Comp.ª do Segundo Regimento de Linha, com “huma
pequena ferida na baze do naris e outra na parede lateral direita do mesmo,
ambas feitas com instrumento cortante, a qual tinha quaze duas pulgadas
de comprido não interessado mais que os tegumentos, a sim como as
sobre ditas”. Foi logo curado pelo Ajudante de Cirurgia do Segundo
Regimento. No dia seguinte, foi o caso apresentado ao cirurgião-mor
Dr. Jozé Soares de Castro. Na visita do dia 27, o sobredito cirurgião-mor
diagnosticou “principio de hum tétano”. O ferido faleceu
a 1º de março e “se procedeo o Corpo de delicto do cadaver”.
“Procedeo-se a novo Corpo de delicto do cadaver” ...”
depois de inumado. A segunda junta médica, que não participou
do primeiro corpo de delito achou que “a causa da morte do ferido
fosse hua simples offença que elles dizem observarão em hum
dos ossos que forrão o nariz”, com o que discordou o Dr. Jozé
Soares de Castro, ao afirmar “que poderia acontecer na ocazião
que o cadaver foi sepultado pelo aperto da terra com a enxada...”
– (notas sinópticas). Cf. Antonio Carlos Nogueira Britto – A Medicina Baiana Nas Brumas Do Passado; APEB – Colonial e Provincial – Maço nº 435 |
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1845 – Sábado, 31 de maio
– O diretor da Faculdade de Medicina da Bahia, Dr. João Francisco
de Almeida, primeiro lente de Medicina Legal na história da nossa
Faculdade, recebeu do lente de Anatomia, Dr. Jonathas Abbott, ofício
comunicando que “muitíssima falta fazem no Amphitheatro Anatomico
desta Faculdade cadaveres para a respectiva demonstração:
a ponto de estarmos quase no meio do estudo de Myologia, e ainda não
tivemos um só cadaver para nelle se verificar o que se pretende discorrer. Ñão he, Excellentissimo Senhor, porque não morrem Doentes no Hospitral da Santa Casa, q.’ essa carência se faz tam sensível: pelo contrario, consta que quando o Guarda do Amphitheatro se dirige ao Deposito para dalli fazer conduzir o cadaver, q.’ alli jaz, Empregados do Hospital se oppoem, allegando que he prezo de Justiça, q.’ he irmão de alguma Confraria, ou que tem enterro, etc.” Cf. F.M.B - Arquivo do Memorial – Acesso: 01.06.05 - 46; 01.06.05 - 47 |
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Terça-feira, 24 de junho –
O mordomo da mesa da Casa da Santa Misericórdia, João José
Rocha Vianna, em ofício ao secretário da Faculdade, Dr. Prudencio
José de Souza Britto Cotegipe, informa que “exceptuados os
cadáveres de pessoas q.’ tem confraria, ou parentes... todos
os mais são levados p.ª o Amphitheatro anatômico da Faculdade
de Medicina; e quanto aos de prezos de justiça ..., esses são
demorados no respectivo deposito até se faserem os necessários
exames policiais, como é de estilo; ... “e para evitar o abuso”..
“mandei fechar a grade do deposito fronteiro ao Amphitheatro ... e
entregar a chave ao Administrador.” Cf. Ibidem |
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Quarta-feira, 25 de junho – O
Dr. Malaquias Alvares dos Santos reenviou ao diretor da Faculdade de Medicina,
Dr. João Francisco de Almeida, “a amostra de massa metallica,
cujo exame me foi por V. S.ª determinado. Procedendo á analyze
quantitativa d’aquella substancia, achei q.’ se compõe
de: 0,91 de cobre em estado metallico, o,06 de ferro e alumina, e 0,02 de
acido silicico; tendo de perda nas diversas operações 0,01.” Cf. Ibidem |
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Segunda-feira, 27 de junho –
Da sala das sessões do Júri, ofício firmado por José
Joaquim dos Santos, Juiz Substituto, encaminhado ao diretor da Faculdade,
Dr. João Francisco de Almeida, comunicando que “Em deferimento
ao q.’ se requerera por parte de Luisa Anna Maria da Conceição,
indicando V. S.ª , com aceitação do Dr. Promotor, p.ª
dar seo parecer sobre os quesitos juntos pelo Procurador da mesma parte
assignados, ...” Eis os quesitos formulados em 27 de junho de 1845 pelo médico
perito Dr. Malaquias Alvares dos Santos, respeitante ao sobredito processo:
“1.º Si um envenenamento pelo acido arsênico, arsênio
branco do Commercio, pode ser caracterisado, ou capitulado simplesmente
pela observação dos seguintes symptomas: vômitos,
febre, suores, ardencia na urina, e pulso pouco accessível? |
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Sexta-feira, 6 de agosto – A
Secretaria da Policia da Bahia, enviou ofício firmado por João
Joaquim da Silva, ao diretor da Faculdade, reclamando “providencias
acerca do inconveniente que encontra a Policia na confecção
de Corpos de delictos visto se recusarem alguns Professores, parecendo justo
q.’ Vossa Senhoria designe dous Facultativos em cada semana que pelo
Administrador do Hospital serão convocados quando necessário
for...” Cf. Ibidem |
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Quarta-feira, 13 de agosto –
Da mesma Secretaria da Polícia da Bahia é solicitado ao
diretor da “Escola Medico-Cirurgica d’esta Província”
“...huma relação dos instrumentos que se fazem necessários
para os exames e corpos de O Dr. Jonathas Abbott recebeu ofício do diretor da Faculdade datado
em 14 de agosto, com outro do desembargador Chefe da Polícia a
respeito do sobredito assunto. Respondeu Dr.Abbott “que no Catálogo
de Hector Bossange em Paris, publicado naquele ano, vinha debaixo do numero
~20692 o titulo de Caixa dos Instrumentos para Autopsias, cujo preço
(sendo a mais completa) he de 200 francos: portanto um pedido p.ª
aquella Capital, e com esta explicação será sufficiente
para vir o que se quer, sem ser preciso individualizar os instrumentos.” |
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1846 – Quarta-feira, 28 de outubro
– Naquela data, o subdelegado da freguesia do Pilar, Bernardino de
Sena Moreira, oficiou ao diretor da “Eschola de Medicina”, Dr.
João Francisco de Almeida, comunicando “que vão a prezença
de V. S.ª oito pombos mortos, trez dos quaes abertos, q.’ se
dis envenenados depropozito em caza de João Ignácio de Sampaio,
do que se procedendo a corpo de delicto disserão os Médicos
os Doutores José Theotonio Martins, e Januario Manoel da Silva não
poderem emitir Juízo sobre a qualidade e natureza do mesmo pela deficiência
dos reagentes chymicos q.’ só estes poderão descobrir
a verdadeira cauza da morte dois ditos pombos; portanto V. S.ª haja
de submeter este facto a esse processo, desejando saber do rezultado p.ª
governo deste Juízo; vai egualmente a substancia alimentar de milho,
e arroz q.’ os referidos pombos q.’ ainda a conservão
nos intestinos, também envenenado.” Cf. Ibidem |
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1849 – Segunda-feira, 9 de
junho – O Chefe de Polícia interino, Antonio Augusto Pereira
da Cunha, da província de Sergipe, remeteu ofício ao presidente
da dita província, Dr. Zaccarias de Góes e Vasconcellos,
exarado nos seguintes termos: “Fallecendo no dia 6 do corrente,
o Escrivão d’Orfãos do Termo d’essa Cidade,
Bartholoméo Jozé Corrêa Beija-flôr, suppôsto
envenenado pela sua escrava Hilária, manda proceder pelos Médicos
o Dr. Francisco Sabino Coelho Sampaio, e o Dr. Joaquim Jozé d’Oliveira
a autopsia cadavérica, e praticada extrahissem parte do fígado,
bofe, estomago, intestinos e cerebro, à fim de se remetterem hermeticamente
fechadas em huma lata para qualquer laboratório chimico da Província
da Bahia á serem competentemente analyzadas, visto n’essa
Província não haver nem os reagentes e nem os laboratórios
chimicos necessários p.ª o respectivo processo. Satisfazendo
os ditos Médicos o que lhes tinha incumbido, extrahirão
somente o estomago, o fígado, e a valvula, (*)
por julgarem isso sufficiente para analyzar, e tudo fecharão hermeticamente
em huma lata de fôlha, que por maior segurança mandei pôr
dentro de huma caixa de madeira, que passo ás mãos de V.
Ex.ª para pelo intermedio de V. Ex.ª ser remettida ao Ilustrissuimo
Senhor Presidente da Província da Bahia, (**)
á quem V. Ex.ª se dignará pedir que dê suas ordens,
para que pelo laboratorio da escola de medicina ou outro qualquer se faça
o exame no que vae dentro da referida lata, remettendo-se para aqui a
narração do resultado do processo.” |
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Quarta-feira, 4 de julho - O presidente
da província, Francisco Gonçalves Martins, remeteu para o
diretor da Faculdade de Medicina da Bahia por cópia o ofício
do chefe da polícia da província de Sergipe acerca do exame
que se faz mister no estomago, fígado, e válvula que estavam
hermeticamente fechados na lata que ao ofício acompanhava, afim de
que mandasse proceder ao dito exame, e fosse informado com o resultado,
para que pudesse satisfazer a requisição do presidente da
província de Sergipe. Cf. APEB – Colonial e Provincial – Maço nº 4046-1 |
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Sábado, 25 de agosto –
Comissão formada pelos Drs. Jonathas Abbott, Eduardo Ferreira França
e Manoel (sic) (Francisco?) Rodrigues da Silva formularam o seguinte parecer:
“Nós abaixo assignados tendo sido encarregados pelo director
da Faculdade de Medicina em virtude da requisição do Excellentíssimo
Senhor presidente da Província, de examinar as entranhas de um individuo,
cuja morte suspeitou-se ter sido proveniente de propinação
de alguma substancia venenosa assinão compromisso pela maneira que
se segue. Paragrafo 1.º - Aberto um caixão de madeira onde estavão encerradas as entranhas, encontramos dentro delle outro de lata sellado em cada angulo de sua face superior com o Sello Imperial; e procedido a abertura deste, achamos uma grande quantidade de liquido, que reconhecemos ser espírito de vinho, em cujo meio existião as sobreditas entranhas; e extrahidas ellas ellas vimos que erão o estomago; fígado; e o cego; que se achavão envolvidos em largas chapas de chumbo ordinário. Parágrafo 2.º - Examinando cada uma destas vísceras achamos sua face exterior de cor cinzenta muito escura, sem offerecer lesão alguma podendo ser attribuida esta coloração ao longo contacto com o chumbo. Abrimos o estomago, que estava unido ao esôfago com seus conductos ligados com cadarço branco, e encontramos no estomago, alem de uma grande porção de gases, uma pequena quantidade de um liquido expesso de côr rosacea que podíamos avaliar em meio a caixa; separamos cuidadozamente este liquido, o qual foi reservado para ser submettido á exame. Exploramos convenientemente a face interna das membranas, e notamos que o estomago appresentava uma cor avermelhada em quase todo toda sua extenção, e que esta cor comprehendia toda a expessura do tecido, sem alguma outra alteração, a não ser o amolecimento da mucosa. Examinando egualmente o cego, couza alguma nelle se encontrou. O figado, que era assaz volumoso, tinha alem da cor já mencionada, uma larga incisão na sua face convexa, tendo quatro polegadas pouco mais ou menos de extenção; tãobem nenhuma lesão nella havia. Parágrafo 3.º - Dividirão-se estas visceras em duas partes, metade ficou conservada no mesmo liquido para um outro exame quando disso haja necessidade. A outra porção, bem como o liquido extrahido do estomago forão separadamente submettidas á uma serie de operaçoens, afim de se descobrir alguma substancia mineral tóxica, principalmente o acido arsenioso, vulgarmente chamado rosalgar, e o sublimado corrosivo, ou solimão, como sendo venenos mais communs , e de q.’ ordinariamente lanção mão os malfeitores; e não obstante os processos mais regulares de q.’ tem feito uzo para cada um destes agentes tóxicos; e q.’ forão por nós empregados, e com especialidade na indagação do arsênico; não nos esquecendo do processo uzado pelo Sr. Orfila, ( *** ) no envenenamento do Duque de Praslin, nenhum indicio appresentou da existência destes venenos; somente obtivemos alguma quantidade de combinação de chumbo, derivado sem duvida a presença das laminas deste metal, com q.’ menos pensadamente se envolverão as vísceras. Parágrafo 4.º - Do que fica exposto parece poder se concluir q.’ a cauza da morte seria talvez o effeito da inflamação do estomago, como se vê no paragrafo 2.º; e se foi motivada por outras cauzas, certamente não se pode observar q.’ o fosse pela acçção das substancias venenosas indicadas. Parágrafo 5.º - Uma consideração ainda nos ocorre, e foi a falta de regularidade com q.’ se procedeo a authopsia, devendo-se ter examinado o estado exterior e interior das sobreditas visceras, para conhecer-se das lesões pathologicas. De mais foi grande erro encerrar as visceras em um vaso impróprio, e envolvel-as em corpos, como o chumbo, que além de sua acção sobre os tecidos, muitas vezes se appresentão em estado de impureza tal, que tornaria de nenhum valor qualquer resultado que se houvesse obtido do exame medico-legal que se havia procedido”. Cf. APEB – Ibidem - Colonial e Provincial – Maço nº 4046-1 |
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Terça-feira, 28 de agosto –
O diretor da Faculdade de Medicina da Bahia, Dr. João Francisco de
Almeida, em ofício de 28 de agosto de 1849, enviou ao conselheiro
presidente da província da Bahia o caixão que a correspondência
acompanhava, contendo o resto das entranhas de Bartholomeo Joze Correa Beija-flor,
falecido em Sergipe, suposto envenenado, que àquele diretor foram
remetidos pelo presidente em ofício de 4 de julho próximo
findo para serem examinadas naquela Faculdade em virtude das requisição
do presidente da província de Sergipe, com o incluso relatório
dos membros da mesma Faculdade por ele nomeados para proceder ao sobredito
exame. O parecer foi remetido ao presidente da província de Sergipe
em 29 de agosto de 1849. Cf APEB – Ibidem - Colonial e Provincial – Maço nº 4046-1 |
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Domingo, 16 de setembro –
Os lentes da Faculdade de Medicina da Bahia, Drs. Francisco Rodrigues
da Silva, Antonio Cerqueira Pinto e Antonio Mariano do Bonfim, firmaram
o seguinte relatório: “Nós abaixo assignados, tendo
recebido do Sr. Conselheiro Director da Faculdade de Medicina desta cidade
um frasco incluído em uma lata, e contendo visceras humanas, p.ª
conforme fôra requizitado pelo Excellentissimo Sr. Presidente da
Provincia examinarmos se continha alg.ª substancia venenosa, procedemos
ás investigaçõens que passamos á expor: |
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NOTAS | |
(*)
Válvula de Bauhin, ou válvula ileocecal, ou barreira dos
boticários, tem a forma de uma fenda (orifício ileocecal),
cujos dois lábios ou valvas (superior e inferior) sobressaem na
cavidade cecal. (**) Francisco Gonçalves Martins, ao depois Barão e Visconde de São Lourenço. (***) Mateo José Buenaventura
Orfila, (1787-1853) – médico legista francês, diretor
da Faculdade de Medicina de Paris. De origem espanhola, nascido em Mahón,
Menorca, em 1787, estudou química em Paris com Fourcroy e Vauquelin.
Após receber seu diploma de doutor em medicina em 27 de dezembro
de 1811, abre um curso público de química; os casos de envenenamentos
são freqüentes e Orfila cria uma nova ciência, a Toxicologia
e publica o “Traité des poisons tirés des régnes
minéral, végétal et animal ou toxicologie générale”,
que lhe abre as portas à Academia de Ciências. Em 1819 é
nomeado professor de Medicina Legal na Faculdade de Medicina de Paris
e, em 1820, é nomeado presidente dos tribunais médicos.
É nomeado professor de Química Médica e, no mesmo
ano, a editora Béchet publica suas “Leçons de médicine
légale” e, no ano seguinte, “Traité dês
exhumations juridiques”.É nomeado Diretor da Faculdade de
Medicina de Paris em 1º de maio de 1831, permanecendo no cargo até
28 de fevereiro de 1848. Cf. Jean-Yves Gourdol – Portraits de Médecins: http://perso.club-internet.fr/jgourdol/Medecins/Medecins
Textes/orfila.html (****) Marsh . “Chimiste anglais
de la première moitié du XIXe siècle.” |
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Fontes primárias – documentos manuscritos originais e inéditos | |
APEB - Arquivo Público do
Estado da Bahia – Guia do Império – Série Instrução
– Ensino Superior – Seção de Arquivo Colonial
e Provincial – Caixa nº 1640 – Maço nº 4046-1
– Faculdade de Medicina da Bahia – (1832-1849). |
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FONTES SECUNDÁRIAS – DOCUMENTOS IMPRESSOS | |
Biblioteca Pública do Estado da Bahia – Seção de Periódicos MH – Bahia - 1942 - Memória Histórica da Faculdade de Medicina da Bahia concernente ao ano de 1942 –Eduardo de Sá Oliveira – Universidade Federal da Bahia – Salvador – Centro Editorial e Didático da UFBA – Bahia – 1992 História Geral da Medicina Brasileira – Lycurgo Santos Filho – Vols I e II -HUCITEC – EDUSP – São Paulo – 1991 A Medicina Baiana nas Brumas do Passado – Antonio Carlos Nogueira
Britto – Arquivos do Instituto Bahiano de História da Medicina
e Ciências Afins - |
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